O Índice de Massa Corporal (IMC) é um sistema amplamente utilizado para avaliar a relação entre peso e altura de uma pessoa, ajudando a identificar possíveis desvios em relação ao peso considerado saudável. Criada há quase dois séculos pelo estatístico belga Adolphe Quételet, a equação que divide o peso pela altura ao quadrado se tornou um padrão internacional nos anos 1970, quando passou a ser chamada de IMC. Desde então, é um método de triagem que orienta profissionais de saúde sobre a necessidade de avaliações mais detalhadas e cuidados específicos.
“O IMC é um exame de triagem para apontar quem vai precisar de mais cuidado”, afirma o endocrinologista Bruno Geloneze, da Unicamp. Porém, o especialista ressalta que a ferramenta é apenas o ponto de partida. O índice, apesar de eficaz para categorizar grandes populações em termos de peso e suas implicações na saúde, deve ser complementado por outras métricas que levem em consideração a distribuição de gordura e os impactos mais amplos no organismo.
Dados recentes indicam a relevância do uso do IMC no cenário atual. No Brasil, a epidemia de obesidade apresentou um crescimento de 60% em um período de 12 anos, segundo uma pesquisa do Ministério da Saúde realizada com 53 mil pessoas e divulgada em 2018. Em 2006, 11,8% dos brasileiros adultos que residem em capitais eram obesos, mas esse número subiu para 18,9% em 2018. A análise, que utilizou o IMC como referência, também revelou um aumento de 26,8% na proporção de pessoas com sobrepeso.
Os riscos associados ao aumento do IMC são amplamente documentados. Estudos destacam que à medida que o índice cresce, também se elevam as chances de desenvolver doenças crônicas, como problemas cardíacos, hipertensão, diabetes tipo 2 e até mesmo certos tipos de câncer. “O IMC funciona bem para separar populações em categorias de risco”, reforçam os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, que citam evidências sobre o impacto do excesso de peso em diversos aspectos da saúde física e mental.
Como funciona o cálculo do IMC?
O cálculo do IMC é realizado dividindo o peso (em quilogramas) pela altura (em metros) elevada ao quadrado. A fórmula utilizada é:
IMC = peso (kg) / (altura (m) x altura (m))
O resultado é expresso em kg/m² e fornece uma estimativa da proporção de gordura corporal.
Interpretação dos resultados da calculadora de IMC
Depois de calcular o IMC, é essencial interpretar o valor obtido com base em uma tabela de referência:
- Menor que 18,5: Magreza
- 18,5 a 24,9: Normal
- 25 a 29,9: Sobrepeso
- 30 a 34,9: Obesidade grau I
- 35 a 39,9: Obesidade grau II
- Maior que 40: Obesidade grau III
Cada uma dessas categorias está associada a diferentes níveis de risco para o desenvolvimento de doenças crônicas, como diabetes e hipertensão.
Qual é a melhor forma de avaliar o peso?
A calculadora de IMC é amplamente usada por sua simplicidade e eficiência como uma ferramenta inicial de avaliação de saúde, mas é importante entender suas limitações. O IMC não leva em consideração fatores como a composição corporal (quantidade de músculos versus gordura), a distribuição de gordura no corpo e até mesmo as diferenças individuais entre pessoas de diferentes idades e sexos. Por exemplo, atletas podem ter um IMC elevado devido à grande quantidade de massa muscular, mesmo não tendo excesso de gordura.
“Considere uma jovem com 1,65 metro de altura e 72 kg. Estaria à beira do sobrepeso com um IMC de 25”, disse Thomas Wadden, professor de psicologia da Escola de Medicina Perelman da Universidade da Pensilvânia. “Mas ela pode ser incrivelmente musculosa e pode ter a maior parte do seu peso na parte inferior do corpo, onde não é tão prejudicial à sua saúde quanto o peso da parte superior do corpo”, completou ele. “Ela poderia facilmente dizer: ‘Estou em perfeita saúde’”, afirmou Wadden.
Além disso, o IMC pode superestimar a gordura corporal em indivíduos com maior massa muscular ou estrutura óssea mais robusta. Os músculos e ossos pesam mais do que a gordura, o que pode levar a uma avaliação equivocada da gordura corporal em atletas ou pessoas com uma constituição mais musculosa. Por outro lado, o IMC pode subestimar a gordura corporal em adultos mais velhos, especialmente aqueles que perderam massa muscular ao longo do tempo, segundo a Harvard TH Chan School of Public Health, em Boston.
Outro ponto a ser considerado é que as mulheres naturalmente têm mais gordura corporal e menos massa muscular do que os homens. Além disso, certos grupos raciais e étnicos têm predisposições genéticas que podem influenciar a quantidade de massa muscular magra ou gordura corporal. Isso implica que a interpretação do IMC pode ser inconsistente quando aplicada a diferentes populações.
O uso do IMC para avaliar crianças também é problemático, de acordo com o CDC (Centers for Disease Control and Prevention). Para crianças, a faixa de peso saudável é baseada em um IMC entre o percentil 5 e 85 nas tabelas de crescimento do CDC, mas essa interpretação é complexa. “É difícil fornecer faixas de peso saudáveis para crianças e adolescentes porque a interpretação do IMC depende do peso, altura, idade e sexo”, destacou o CDC.
Existem outras opções?
Apesar das limitações do IMC, muitos médicos ainda o utilizam devido à sua simplicidade, praticidade e baixo custo, sendo uma ferramenta de fácil acesso para avaliar a saúde de forma rápida e inicial. No entanto, existem outras alternativas que tentam medir a gordura corporal de maneira mais precisa, como a circunferência da cintura, que pode ser útil para detectar a gordura visceral, o tipo de gordura mais prejudicial à saúde.
A gordura visceral, também chamada de gordura “oculta”, é aquela que fica armazenada sob os músculos abdominais, ao redor dos órgãos internos, como fígado, coração, rins e intestinos. Embora pessoas magras também possam ter gordura visceral – uma condição conhecida como TOFI, ou “magro por fora, gordo por dentro” –, ela geralmente é associada ao aumento da circunferência abdominal. Esse tipo de gordura é especialmente perigoso, pois excreta proteínas inflamatórias que podem aumentar o risco de várias condições graves, como colesterol alto, doenças cardíacas, derrame, diabetes tipo 2, resistência à insulina e até doenças neurodegenerativas, como o mal de Alzheimer.
“Os homens devem ter menos de 100 cm de cintura e as mulheres menos de 88”, afirmou Thomas Wadden, professor da Escola de Medicina Perelman da Universidade da Pensilvânia. “Qualquer coisa acima desses números pode levar a gordura intra-abdominal na parte superior do corpo, onde é mais provável que se associe a complicações de saúde”.
Além disso, outras ferramentas como a relação cintura-altura, que calcula a razão entre a circunferência da cintura e a altura da pessoa, estão sendo cada vez mais discutidas na medicina. Alguns pesquisadores consideram essa medida um bom preditor de saúde cardiovascular futura, uma vez que é fácil de calcular e depende menos da idade. No entanto, ela não é indicada para crianças menores de 6 anos, conforme indicado em uma revisão da literatura de 2022.
Apesar dessas alternativas promissoras, a aplicação clínica de métodos como a relação cintura-altura ainda enfrenta desafios práticos. “As outras ferramentas que podemos usar para medir a gordura corporal simplesmente não são práticas no sentido clínico”, disse Dr. Justin Ryder, professor associado de cirurgia e pediatria da Feinberg School of Medicine, na Northwestern University, em Chicago. “São boas ferramentas do ponto de vista da pesquisa, mas implementá-las na prática clínica só adicionaria custos ao paciente. Elas também não são mais informativas do que os métodos que estamos utilizando atualmente”, completou.
IMC para crianças e adolescentes
O uso da calculadora de IMC em crianças e adolescentes deve ser tratado com cautela, pois os parâmetros de interpretação para essas faixas etárias são diferentes dos utilizados para adultos. Isso ocorre porque o crescimento e desenvolvimento das crianças devem ser levados em consideração. Nesse contexto, o acompanhamento de um profissional de saúde é essencial para garantir que o crescimento esteja dentro dos padrões esperados.
De acordo com o Atlas Mundial da Obesidade 2024, lançado pela Federação Mundial de Obesidade, o Brasil pode ter até 50% das crianças e adolescentes entre 5 e 19 anos com obesidade ou sobrepeso até 2035. Em 2020, a prevalência de crianças e adolescentes com IMC elevado era de 34%, o que corresponde a mais de 15 milhões de afetados. A expectativa é que essa taxa continue a crescer nos próximos anos, alcançando mais de 20 milhões de crianças e adolescentes obesos ou com sobrepeso em 2035. O estudo projeta uma taxa anual de crescimento de 1,8% da obesidade nessa faixa etária até 2035.
Em relação à obesidade global, um estudo publicado no The Lancet revelou que a obesidade mais do que dobrou entre adultos e quadruplicou entre crianças e adolescentes de 5 a 19 anos, entre 1990 e 2022. Em 1990, havia 31 milhões de crianças obesas, enquanto em 2022 esse número subiu para 159 milhões. Para os adultos, o número de pessoas obesas passou de 195 milhões para 879 milhões no mesmo período.
“Condições genéticas, individuais, comportamentais e ambientais podem influenciar no estado nutricional. Por se tratar de um fator multifatorial, a obesidade infantil exige intervenções integradas de diversos setores, além dos profissionais de saúde, como a família e outras instituições, para deter o avanço da doença e garantir o pleno desenvolvimento durante a infância”, explica o pediatra Hamilton Robledo, da rede de hospitais São Camilo de São Paulo.
A obesidade na infância não só prejudica a saúde imediata das crianças, como também aumenta as chances de a pessoa continuar obesa na fase adulta. “Oito em cada dez adolescentes continuam obesos na fase adulta. E a obesidade, se não controlada, pode acarretar problemas como diabetes, hipertensão arterial, problemas cardiovasculares, aumento do colesterol e até alterações esqueléticas e de postura”, destaca Robledo.
A importância de consultar um especialista
Apesar de a calculadora de IMC oferecer um ponto de partida para entender o estado nutricional, é aconselhável buscar a opinião de um nutricionista ou médico para uma análise mais completa. Esses profissionais podem considerar outros aspectos, como porcentagem de gordura corporal, circunferência da cintura e histórico médico, para fornecer uma avaliação mais precisa.
Conclusão
A calculadora de IMC é uma ferramenta prática e acessível para fornecer um panorama rápido sobre o estado nutricional. No entanto, por não considerar diversos outros fatores de saúde, deve ser vista como um ponto de partida e não como uma única forma de avaliação. A orientação de um profissional é essencial para um diagnóstico completo e um plano de saúde adequado.